TJBA - DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO - Nº 3.161 - Disponibilização: segunda-feira, 22 de agosto de 2022
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Prisão em flagrante convertida em preventiva em 10/04/2022.
Denúncia recebida em 06/06/2022.
Resposta à acusação apresentada na data de hoje.
Assevera que “no caso presente, quando se verifica que o suposto obstáculo rompido foi um simples lacre de cueca, e que os
bens objeto da tentativa de furto - uma cueca e uma barra de chocolate – foram devolvidos ao estabelecimento comercial, não
há como negar a irrelevância penal da conduta.”, concluindo que a conduta imputada ao Custodiado é insignificante para causar
perigo de lesão ao bem jurídico penalmente protegido, pelo que pugna pelo trancamento da ação penal, pela falta de tipicidade
material e, subsidiariamente, pelo relaxamento da segregação cautelar do Increpado, já que ausente a periculosidade que justifique a imposição da medida extrema.
Sustenta, ainda, a inobservância à norma inscrita no art. 312 do Código de Processo Penal, eis que ausentes, na hipótese em
tela, os fundamentos e requisitos necessários à decretação da prisão preventiva, mormente em face do princípio da homogeneidade.
Nesse compasso, pleiteia a concessão, em caráter liminar, da Ordem de Habeas Corpus, a fim de que o Paciente seja colocado
em liberdade, mediante a expedição de Alvará de Soltura em seu favor, com a posterior confirmação da medida liberatória em
julgamento definitivo.
Instrui a Inicial com documentação diversa.
É o Relatório.
DECIDO:
O deferimento de medida liminar em Habeas Corpus não apresenta previsão legal, resultando o seu cabimento de construção
jurisprudencial e doutrinária. Cabe destacar que, sendo satisfativos os efeitos da medida liminar, esta apenas deve ser deferida
em caráter excepcional, o que somente se justifica, por sua vez, quando inequivocamente demonstrado o constrangimento ilegal
infligido ao Paciente.
Ainda assim, enquanto medida cautelar, a liminar em Habeas Corpus não deve representar antecipação dos efeitos da decisão
meritória, cingindo-se, pois, aos casos de acautelamento do direito pleiteado, e não às hipóteses de sua satisfação.
Consoante relatado, o fundamento do Writ assenta-se, em essência, nas teses de trancamento da Ação Penal n.º 800192187.2022.8.05.0124, em razão da atipicidade material da conduta imputada ao Paciente; inexistência de fundamentação idônea
para decretação da custódia preventiva do Paciente, mormente em face do princípio da homogeneidade.
Inicialmente, vale destacar que a legítima aplicação do princípio da insignificância a afastar a tipicidade material de condutas
que provocam ínfima lesão ao bem jurídico tutelado, não se baseiam, tão somente, pelo valor dos bens, mas também pelo preenchimento de outros pressupostos, quais sejam: a) a mínima ofensividade da conduta do agente; b) nenhuma periculosidade
social da ação; c) reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento; e d) inexpressividade da lesão jurídica provocada.
No caso dos autos, constata-se que o Paciente responde a outras ações penais em diversas comarcas do Estado da Bahia pela
prática de delitos da mesma natureza, ostentando, ademais, condenações transitadas e julgadas em seu desfavor, além de possuir anotações da prática de atos infracionais análogos a crime de furto e roubo. Tais circunstâncias afastam indicam a periculosidade social do Paciente LUAN GOMES COSTA e o elevado grau de reprovabilidade da conduta a ele imputada, pelo que não
resta cabível o reconhecimento da atipicidade material da conduta ante a aplicação do princípio da insignificância.
A jurisprudência da Corte da Cidadania aponta neste sentido, conforme ementas abaixo transcritas de recentes julgados oriundos
das 5.ª e 6.ª Turmas daquele Sodalício:
AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. FURTO QUALIFICADO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. PERICULOSIDADE SOCIAL E ELEVADO GRAU DE REPROVABILIDADE DA CONDUTA DO PACIENTE, QUE APRESENTA MAUS ANTECEDENTES E MÚLTIPLA REINCIDÊNCIA EM CRIMES PATRIMONIAIS. [...] PACIENTE REINCIDENTE E
PORTADOR DE MAUS ANTECEDENTES. […] 1. A orientação do Supremo Tribunal Federal mostra-se no sentido de que, para
a verificação da lesividade mínima da conduta, apta a torná-la atípica, deve-se levar em consideração os seguintes vetores: a) a
mínima ofensividade da conduta do agente; b) a ausência de periculosidade social da ação; c) o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; e d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada, salientando que o Direito Penal não se deve ocupar
de condutas que, diante do desvalor do resultado produzido, não representem prejuízo relevante, seja ao titular do bem jurídico
tutelado, seja à integridade da própria ordem social. 2 O fato de o paciente ser reincidente específico em crimes patrimoniais,
além de também ostentar maus antecedentes por crimes de mesma natureza, denota sua periculosidade social e o elevado grau
de reprovabilidade da conduta. Desse modo, não preenchido o requisito relativo ao reduzido grau de reprovabilidade do comportamento do paciente, não verifico nenhuma ilegalidade a ser sanada em virtude do não reconhecimento da atipicidade material
da conduta ante a aplicação do princípio da insignificância. […] (AgRg no HC n. 731.807/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da
Fonseca, Quinta Turma, julgado em 26/4/2022, DJe de 29/4/2022.)
AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS. FURTO QUALIFICADO. PRETENSÃO DE RECONHECIMENTO DA ATIPICIDADE MATERIAL DA CONDUTA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. FURTO PRATICADO MEDIANTE ESCALADA POR ACUSADO REINCIDENTE E POSSUIDOR DE MAUS ANTECEDENTES. […] 2. Caso em que o acusado, reincidente e possuidor
de maus antecedentes, é acusado de furto qualificado pela escalada, circunstâncias que afastam a aplicação do princípio da
insignificância. Precedente. […] (AgRg no HC n. 751.258/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em
9/8/2022, DJe de 15/8/2022.)
Lado outro, em consulta ao Decreto Preventivo originário (fls. 30/32 do ID. 33113725) encontra-se devidamente fundamentado
com a adequada valoração de aspectos fáticos, devidamente consignados pelo Julgador singular e que acentuam a reprovabilidade do ilícito sob apuração. Confira-se:
[…]Cuida-se de COMUNICAÇÃO DE PRISÃO EM FLAGRANTE, procedida, tempestivamente, pela diligente Autoridade Policial,
na forma do art. 5º, LXII, da C. Federal, dando conta de que, em consonância com o “auto de prisão” dado à lume, na data de
09/04/2022, em Mar Grande, restou detido em “flagrante delito” o indivíduo identificado como LUAN GOMES COSTA, pela prática, em tese, do delito insculpido no art. 155, § 4º, I, do Código Penal (furto qualificado por rompimento de obstáculo à subtração
da “res furtiva”), vulnerando o patrimônio das Lojas Americanas
[…]