3544/2022
Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região
Data da Disponibilização: Quarta-feira, 24 de Agosto de 2022
3340
e o arcabouço jurídico altamente codificado, o que vai de encontro
aos países do sistema anglo-saxão, nos quais não existe uma
Esse novo sistema inserido pelo legislador potencializa mitigar, elidir
Constituição formal, ou esta Constituição é sintética.
os direitos e garantias individuais, mascarando em um outro sistema
Agora, nós temos um sistema jurídico em que o Poder emana do
de direito consuetudinário, que tem como fulcro o direito econômico
povo, o qual elege seus representantes no legislativo, para fazer
e o pragmatismo, o consequencialismo jurídico.
leis, ou seja, a norma oriunda do poder legislativo, a fonte formal é a
Ocorre que a doutrina e jurisprudência estão importando institutos
lei, em sentido amplo. E temos também um sistema de “common
do sistema “common law”, esquecendo que o nosso sistema
law”, no qual a fonte formal são os precedentes judiciais, não mais
jurídico, o nosso “common law à brasileira”, é diferente
com caráter meramente persuasivo, mas normas criadas pelos
axiologicamente e mesmo deontologicamente. Esse sistema
tribunais superiores, in casu, o STF, muito embora a origem não
híbrido, misto, plural ou de saldada de frutas impõe que seja criado
seja consuetudinária, baseada no costume. O STF tem a função de
um sistema próprio de exegese, hermenêutica, interpretação da lei
criar uma regra de decisão baseada na interpretação da lei que o
em sentido amplo, sob pena de termos pluralismo jurídico em um
legislador criou, o que é diferente da essência do sistema
mesmo sistema estatal, ou seja, dois sistemas paralelos em que um
americano e inglês de “common law”.
anula o outro.
A questão é avaliar se hoje há no Brasil um PLURALISMO
Apesar de a doutrina e jurisprudência se inclinarem apenas para o
JURÍDICO estatal e não, necessariamente um sistema híbrido,
overruling e distinguishing como únicas formas de superação de
misto ou de salada de frutas, ou seja, dois sistemas, o “civil law” e o
precedente, isso se aplica ao sistema anglo-saxão, o qual não tem
“common law”. O primeiro baseado em leis e na Constituição de
Constituição analítica, sistema rígido para Emenda Constitucional e
1988, e o segundo baseado no Direito Econômico e no
é baseado em relações contratuais, mercantis, financeiras,
consequencialismo jurídico. A forma como manuseados esses dois
liberalismo, Constituição sintética ou inexistente e, sequer tem o
sistemas é que vai determinar se o ordenamento jurídico brasileiro é
instituto da reclamação.
híbrido, misto ou plural, dois sistemas paralelos.
A nossa Constituição é extensa, analítica, não é concisa como a
O “common law” tem uma estrutura baseada em relação
americana ou inexistente como a inglesa, motivo pelo qual se
comercial/mercantil e de direito econômico/financeiro liberal, na
adotarmos o sistema de superação dos precedentes americano ou
proteção do contrato, no garante do contrato, da propriedade
inglês, sem olhar para a nossa realidade, passamos a ter um
privada; o alicerce é a proteção dos costumes capitalistas liberais.
sistema que depende da composição momentânea dos tribunais
E aí nós temos um grande problema. Nossa Constituição Federal de
superiores e não da lei, ou seja, depende da vontade do homem e
1988 é uma Constituição Cidadã, ela protege os direitos e garantias
não da lei.
individuais, os direitos sociais e é principiológica. Inclusive
A nossa realidade é outra.
estabelece cláusulas pétreas. Note-se que, como princípio
Ocorre que a lei permanece, o sistema é altamente codificado e não
fundamental, lá no art.º 1 da CF, temos a dignidade da pessoa
contempla mutação legal ou constitucional, em caráter de
humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa. Não é
pragmatismo jurídico de Richard Posner ou do consequencialismo
possível direcionar para o direito econômico e financeiro o principal
de MacCormick, pela análise econômica do direito, a qual já foi
norte das relações humanas no Brasil. Não trato de questões
considerada a “arma ideológica do capitalismo”. Gostemos ou não,
ideológicas, mas da estrutura do ordenamento jurídico brasileiro.
há dirigismo estatal, previsto na Constituição Federal.
O art.60 da Constituição Federal brasileira reza que:
O pragmatismo pode ter consequências sistêmicas negativas com
“Art 60 - § 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda
base em análise econômica descontextualizada dos direitos e
tendente a abolir:
garantias fundamentais.
IV - os direitos e garantias individuais.”
Não se exige um controle rígido no STF, e.g., para mutação
constitucional, o que ocorre no legislativo para mudar a
Constituição. Em suma, não há necessidade de unanimidade, de
Ora, o efeito “non cliquet” dos direitos humanos significa que os
apenas onze ministros, para mudar a interpretação sobre a
direitos e garantias individuais não podem retroagir, só avançar nas
Constituição Federal atribuindo efeito normativo, para o futuro,
proteções dos indivíduos, isto é o princípio da vedação do
criando uma regra de decisão. Se nem onze juristas precisam se
retrocesso, ou seja, os direitos humanos só podem avançar.
entender, quiçá há vinculação aos 18 mil juízes, mais um milhão de
advogados e 220 milhões de brasileiros.
Código para aferir autenticidade deste caderno: 187589